Gabinete do Director

Exacto, era uma pergunta como tantas outras que diziam respeito à minha vida privada e ela era uma aluna, não lhe dizia respeito. - Porquê que quer saber? Não estamos aqui para ter conversas de ocasião - respondi no meu habitual tom rígido. Eu bem que não olhava, estando atento aos seus movimentos provocadores.
Observei a cópia do documento. Ela tinha razão - Nesse caso, ligamos aos seus encarregados para que possamos resolver isto o quanto antes - disse, não me deixando vaguear naquele deu olhar selvagem e determinado - Prefere a sua mãe ou o seu pai?

-Não,não me vou meter e peço desculpa. Alias tudo o que eu lhe iria dizer não ia ter relevância visto a minha idade. Estarei errada? - suspirei e encostei-me melhor ao seu banco ligeiramente desconfortável, o seu olhar rígido, por muito que fosse sensual quebrava-me o coração. Ele pode nunca mais ser feliz por uma cabra qualquer que o traiu.- Hmm pode-me expulsar já, não me deixe criar laços aqui e depois me expulsar porque esses papéis nunca vão ser assinados por eles. Nunca assinaram nada, só os vejo uma vez por ano e é para tratar de burocracias. - Retrai o corpo e fitei-o desta vez havia deixado o meu olhar um pouco provocador de lado. - Sei como as coisas funcionam, já não é a primeira, nem a quinta vez. - murmurei e dei-me conta de estar a brincar com os seus dedos.

Para a idade dela, a rapariga até era perspicaz - Exactamente, Menina James. A não ser que fosse realmente algo relevante - coisa que nunca acontecia. Estes jovens só sabiam dizer porcarias hoje em dia. Por isso mais valia nem escutar.
Não ia expulsá-la, claramente. Os seus pais pagavam para a ter aqui - A Brianna pode não os assinar, desde que os seus encarregados o permitem - respondi, dando uma olhadela rápida nos documentos. Ao que parecia, se a relação que ela tinha com os seus pais era assim tão afastada, não valia muito a pena a assinatura daquele documento. Porém eu tinha de fazer o meu papel de diretor na mesma - Fazemos desta maneira. Eu vou ligar ao número do seu pai, que está aqui registado. Veremos a resposta dele.

-Não duvide das minha capacidades. - murmurei e olhei atentamente para ele. - Boa sorte para isso, ele raramente atende ligações. - informei-o e depois estiquei a minha mão para lhe dar o lápis que outrora havia tirado. O meu olhar rapidamente se prendeu a uma espécie de insecto que pousava pela sua cara. - Não se mexa. - pedi e levantei-me aproximando-me dele, debrucei-me e peguei naquele insecto verde e um pouco grande. Abri a janela e soltei-o, voltando a fecha-la pouco tempo depois e fiquei completamente presa a vista que circundava aquele lado do colégio.- Não pensei que sou uma coitadinha ou que tenho pena de não ter os pais presentes, preso muito a minha independência. - larguei um levo suspiro e recuei alguns passos sem dar conta que ia embater naquele seu corpo e sentir toda aquela sua constituição embatida no meu corpo, virei-me e olhei-o nos olhos. Não era mas baixa que ele, alias era praticamente da sua altura o que fazia ter uma vista privilegiada. O meu olhar voltou a colidir com o seu, e os tons deles combinavam numa harmoniosa dança de olhares.

- As suas capacidades? Já vi na sua ficha que é aluna de topo e que vem de uma família com educação política. Deste modo, não consigo mesmo perceber a sua inusitada pergunta ou relacioná-la com as suas capacidades - disse, deixando que na minha voz transparecesse um pouco de sarcasmo.
- Já percebi que sim. - Peguei no telefone e marquei o número. Deixei chamar durante trinta segundos porém ninguém atendeu. Ela tinha razão. - Mas o quê... - Um inseto. Outra vez a sua pele a tocar na minha. Não gostava nada. Até que ela caiu para trás e eu instintivamente agarrei-a, apesar de odiar fazê-lo. O nosso olhar cruzou-se por uns segundos mas depressa o afastei e ajudei-a a levantar-se.
- Tenha mais cuidado - disse num tom reprovador.

- Não me referia a capacidades de domínio cognitivo, mas sim de ter uma conversa onde o consiga perceber. Pois já entendi que subestima os jovens e as suas capacidades de compreensão.- soltei uma leve gargalhada ao observar a sua cara de reprovação mal tirei o bicho da sua cara. - Obrigada. - murmurei em agradecimento ao seu gesto. - Mais cuidado? Não obrigada. - fitei-o desta vez com uma mudança de atitude, para algo mais relaxada, porém sempre com respeito a sua figura. - Cometer erros faz-nos crescer, é bom cair e ter alguém para nos ajudar a levantar. Ou então cair e levantar-nos sozinhos, nao nos deixarmos cairmos e presos na mesma coisa, isso é de prezar. - opinei refletindo um pouco sobre a minha vida, coisa que ele não sabia pois o meu pai ocultou dados na inscrição do colégio.

- Tenho razões para subestimar. - respondi. Muitos dos alunos do colégio eram insolentes, ocos e desrespeitosos. Na maior parte das vezes, nem uma conversa civilizada consegui ter com eles.
Tentei não revirar os olhos - Essa é uma metáfora muito gira que pode praticar fora do meu escritório. Aqui simplesmente tenha cuidado por onde anda. - Até agora a aluna mostrava ter mais maturidade que a maior parte dos alunos do colégio. Mesmo assim, nunca se podia fiar completamente num jovem.

-Não, peço imensa desculpa mas não têm. Pensava que um dos lemas do colégio era ''Não ao estereotipo''. - adverti num tom passivo.
Acabei por soltar uma gargalhada harmoniosa seguindo-se de um sorriso um pouco divertido. - Ligeira falta de educação expulsar-me do seu gabinete.- voltei a gargalhar. Tateei a sua mesa de madeira e peguei num objeto cuidadosamente passando por lá a mão sentindo a textura fria do mesmo.

Talvez um dos lemas do colégio, mas não o meu. Conhecia muito bem o mundo e era por isso que agia da minha própria maneira. - Já nem se trata muito disso. Todos os dias ocorrem acidentes neste colégio devido à rebeldia e insolência dos jovens.
Suspirei e endireitei-me na cadeira - Não estou a expulsá-la do meu escritório. Ainda tenho de arranjar solução para este seu problema - disse, referindo-me ao documento.

- Sim, mas não é por uns matarem que o resto do mundo é criminoso, certo? - suspirei e acabei por em debruçar novamente sobre a sua mesa, o problema era que não foi apenas uma parte do decote que descaiu, mas sim o decote completo, dando lugar a vista dos meus seios perfeitamente desenhados e do agrado de quase todos.
- Sugiro que o coloque de parte, e o esqueça visto que não há maneira...quer dizer. - suspirei e peguei no papel retirando-o das suas mãos com calma. - Têm uma caneta por favor? - perguntei baixo e olhei-o nos olhos. - Eu reli o papel, embora eles sejam os meus tutores eu sou maior de idade, o que me dá direitos acrescidos.- suspirei e peguei na caneta assinando o meu nome cuidadosamente de forma a assinatura ficar perfeita aos olhos de qualquer um. - É verdade...tenho que falar consigo. Têm por aí um portátil? Tenho uma sugestão para a escola...- a verdade é que trabalhada naquele projeto a relativamente pouco tempo mas o resultado ficou incrível,.

Novamente aquela aluna conseguia ser perspicaz e dar a volta à situação. - Mas nesse caso o mundo torna-se desconfiado. É a mesma coisa nesta situação.
A rapariga não se podia exibir um bocadinho mais? pensei sarcásticamente. Fitei apenas os seus olhos, não olhando para mais nada. Passei-lhe a caneta e fiquei notoriamente mais satisfeito quando ela assinou o documento. - Depende da sugestão. Pode dizer-me agora e depois logo vejo se lhe empresto o computador.

-Desconfiado? E é por isso que vai desconfiar que todos são criminosos, sabendo que só 30 % da população o é?- suspirei e inclinei-me para trás deixando de se ver nada, o pior era que ainda não havia dado conta de tal.
- Basicamente desde os meus 5 anos que mexo em computadores, dos 12 em programação e passado um ano fazia aplicações android, no dia em que vim cá a escola apercebi-me que o colégio é demasiado grande, então peguei no esboço em 3D da escola,disponível no site, e criei uma aplicação que através da rede de wi-fi, nos permite saber onde estamos,também conectei com um dos circuitos e...era muito mais fácil se me deixasse mostrar. - murmurei por fim cansada de explicar, pois conseguia mostrar-lhe.- Basicamente faz com que pessoas como eu não se percam e tenham a percepção de onde estão. - murmurei baixinho e peguei no meu telemóvel, desbloqueei-o rapidamente e passei o dedo agilmente até chegar a aplicação.- Aqui. - apontei para uma pequena bola vermelha. - É onde me encontro. - carreguei levemente sobre ela e apareceu a informação com o respectivo local de onde me encontrava aka Gabinete do Diretor.

Por isso e também porque não se podia confiar em ninguém. Eu sabia-o bem. - É sempre bom estar preparado para prevenir a queda - aquilo tinha um duplo sentido.
Fiquei a ouvi-la, ficando na dúvida se ela seria assim tão inteligente. Ela estava a falar de um GPS interino, algo que não teria somente utilização para os alunos mas que também poderia ter benefícios para mim... Soava-me a uma boa ideia. Mas valia deixá-la experimentar. Passei o computador portátil para a mesa e abri-o. Verifiquei que não havia nenhum ficheiro à vista e passei-o - Mostre-me isto por detalhes.

- A minha metáfora do cair e levantar entrou a 100 e saiu a 200? - Acabei por brincar com a situação e lance-lhe um sorriso.
-Isto por muito que pareça não é apenas um mapa interativo, pode ir muito mais além disso...vejamos o meu caso, pois sou a única aluna inscrita neste aplicativo.- Peguei no computador- Aqui,no nome de utilizador era o número de processo na escola, neste caso 514, e na password os últimos dígitos do B.I., ou seja, para dar mais privacidade e não só. O meu quarto está ligado ao meu numero de processo, assim como o meu horário de forma a não me perder e receber alertas sempre que temos aulas ou atividades, aí o senhor iria entrar ao colocar no programa a informação com o Sítio, o Local e a Hora .- fiz uma pausa um pouco cansada. - Aqui, encontra-se um sinal de visível ou invisível, isto serve para que quando adicionarmos as pessoas, e claro, se elas tiverem visíveis as possamos encontrar facilmente.- Estava de pé ao seu lado e ia-lhe mostrando tudo através do seu computador e do meu telemóvel, que servia como ilustração\exemplo.

- Esta é a minha forma da sua metáfora, se assim preferir chamar-lhe. - revelei, estreitando os meus lábios para não sorrir.
Assim que explorei a aplicação com ela, percebi que aquilo era de facto bastante útil. E também me daria benefícios na medida em que, ao controlar esta rede, poderia ter os alunos debaixo de olho. - E a Brinna fe isto tudo sozinha?

-Que na minha perspectiva é errada. - sorri novamente e olhei para ele atenta.
-Sim fiz, mas como aluna, e não querendo que o senhor ande sempre debaixo de olho de nós, o visível e incivil funciona para si também, porém pode sempre controlar o que estão visíveis.- mirei-o atentamente e puxei uma cadeira para ao pé dele para lhe mostrar. - Se ligar a rede de alunos aqui, automaticamente todos estarão inscritos, basta apenas fazer o download do aplicativo, que têm um custo de 0,50 cêntimos que reverte para uma instituição, p'ra ser mais concentra o orfanato do fundo da rua que está a precisar de fraldas e assim,- suspirei e encostei-me a sua cadeira, mais confortável que a outra.

- É o seu ponto de vista. Um dia verá que tenho razão. - Disse num tom convicto. Agora ela era jovem e não tinha noção de como era a vida.
Ambos sabíamos que não ia ser bem assim. Não haveria um único aluno a ser visível para mim. Teria de contornar as regras nesse aspecto. Olhei para ela depois daquilo tudo. Era um bom trato. - Tem a certeza que o dinheiro vai parar à instituição? - era de admirar que um jovem como ela, rica, tivesse este tipo de iniciativa.

- Acha mesmo que vou desistir tão facilmente do meu ponto de vista? Há coisas que valem a pena lutar, não vale a pena ficar presos a um erro, a algo de mal...Como se costuma dizer : Fecha-se uma porta, abrem-se duas janelas. - voltei a sorrir.
-Não faça esse ar e acho que não me expliquei bem, o senhor tem acesso a todos os alunos, e eles não escolhem para quem estão invisíveis ou não...se ficarem visíveis é para todos os amigos e para si também. - suspirei e esclareci mal reparei na sua cara que mostrava descontentamento no meu projeto. - Sim tenho, posso confirmar consigo, aqui e agora se quiser. - suspirei e coloquei uma expressão facial de desagrado perante a sua desconfiança. - Mas preferia que confiasse em mim. - o que dizia era totalmente verdade, não fazia nenhum sentido ficar com dinheiro de algo que me deu tanto prazer a fazer.

Não disse mais nova porque ela ainda era nova, não sabia do que falava.- Nem tudo é assim tão fácil e cor-de-rosa, Menina James - Enfim, um dia todos eles, jovens, cairiam na realidade. No meu colégio, eu treinava-os para isso.
- Sim, já ouvi o que disse Brianna. Tornou as suas regras bastante compreensíveis - respondi com suave tom de humor. Obviamente que eu não ia seguir aquilo, mas isso era outro assunto que apenas a mim dizia respeito. Ainda não tinha razões para confiar nela e, provavelmente, nunca teria. Reavi o meu computador e fechei-o. - Tem autorização para autenticar a sua aplicação no colégio.

-Acha que o meu mundo é cor-de-rosa, então não fale. Apenas sabe o meu nome e o meu historial escolar, mais nada. - Desta vez assumi um tom frio quase gélido da minha parte.- Acha que eu não sei o que anda a tentar fazer? Fez isso tudo para que no fim você consiga dizer e ter razão que o Amor não presta, vai quebrar o coração e a esperança...mas só a alguns, e meu caro senhor, enquanto houver esperança há chance, há vida. - voltei a suspirar.
-Está aqui o aplicativo, não poderá fazer mudanças sem a minha devida autorização, pois o aplicativo é meu.- esclareci de forma clara e antes de encerrar o computador ainda lhe mostrei ara onde ia o dinheiro.- Obrigada, Diretor. - fechei os olhos e olhei para o chão.

Nisso ela tinha razão, eu só conhecia o que necessitava saber sobre ela. Mais nada. - Então estamos acabados neste assunto. - respondi, mostrando que a conversa acabava ali. Ela era tão inocente se ainda acreditava no amor. O amor só servia para nos iludir, era uma porcaria completa. E talvez aquele fosse o propósito do meu estágio matrimonial, talvez não fosse.
Isso veríamos nós. Eu também sabia como funcionavam estes aplicativos e não teria problema em entrar no sistema, se fosse preciso. - Compreendido. - Respondi e levantei-me da cadeira. Eu já estava de saída e ela também. Por último, suspirei e olhei-a - A resposta à sua pergunta era sim. Mas não volte a fazer perguntas pessoais, não lhe responderei.

-Deixe-me só terminar, não gosto de coisas por dizer, quando há um sistema que falha na escola o que acontece? - perguntei atenta querendo os detalhes para terminar a minha tese de forma brilhante. - Já ouviu falar em intensidade? Intensidade é a única palavra que define a minha vida. - murmurei desvendando um pouco do meu mistério.
-Compreendido.repeti o que outrora me havia tido e um sorriso acabou por se desenhar e um brilho repentino apareceu no meu olhar fitando-o com mais interesse do que outrora. - Daria um ótimo pai, boa sorte com isso. -levantei-me e arrumei a cadeira, não suportava mais a proximidade, o seu cheiro e o seu olhar penetrante e complexo.

- Bom, eventualmente tenta-se reiniciar e reparar o sistema o quanto antes. Se não houver solução possível, renova-se o sistema por um novo - respondi, entendo a pertinência da sua pergunta. Intensidade. Era um modo algo...interessante do qual reger a vida.
Eu escusava os seus comentários. De nada me serviam e só me faziam, mais uma vez, repensar na minha vida. Eu nunca daria um excelente pai mas, provavelmente, também nunca teria essa sorte.
- Agora que estamos conversados, já pode sair. Está livre destes assuntos.

-Pense no sistema como se fosse a sua vida, reiniciar e reparar e renovar.- levantei-me e assente. Fitei-o mais uma vez e olhei-o nos olhos.- Não faça essa cara, não precisa de mulher para ter filhos, no fim da rua existem mais de 100 que precisam de si. - encostei-me a porta. - Obrigada pelo tempo desperdiçado e por depositar 0,04% da sua confiança em mim. - abri a porta colocando a minha mão sobre a maçaneta e dando um jeito leve para que ela abrisse. - Adeus Mr Sullivan. - o meu vulto desapareceu por trás da porta e antes que me fosse embora abri novamente a porta.- E não, não acredito no amor apenas tenho esperança que ele exista ou apareça dentro de cada um de nós, mas não se preocupe que o seu está só ferido, não congelou como o meu. - o meu vulto desapareceu dando lugar ao corredor escuro, deambulei pelo resto do corredor e esqueci-me do teu telemóvel lá, o que vale era que com o tablet o localizaria depressa, todavia com os bloqueios que lá meti será impossível aceder a ele.

Ela estava comparar a vida humana a um sistema virtual? Como se alguma vez fosse assim tão simples e fácil.
Eram mais de duzentas, aliás. Mas isso nunca me interessara. Várias mulheres não, somente uma. E vê no que isso deu... Não disse mais nada e via-a sair. Rapariga estranha e perspicaz. Abanei a cabeça e voltei para a minha secretária. Abri o computador e fui logo entrar na sua aplicação, estudando-a para ver qual a melhor maneira de contornar o seu sistema de segurança. Fiquei ali umas duas horas até que algo tremeu em cima da mesa. Não era o meu telemovel, era o dela. Esperava que não estivesse ali de propósito. Agora tinha de chegar alguém para o entregar. Porém já tinham todos saído por esta horas. Raios. Entregaria o aparelho no dia seguinte.
Suspirei e acabei por ir para casa, levando-o comigo.

encerrado.