Gabinete do Director

Demorei algum tempo até ouvir o bater da porta. Baixei a música. - Entre! - disse. Só esperava que não fosse mais nenhum aluno para fazer uma miserável cena. Quando a rapariga entrou, percebi que era Brianna James.

Ui, pela voz parecia um pouco mais austero. -Com licença. - murmurei e invadi o seu espaço começando a olhar a volta a procura do meu telemóvel e suspirei.- Deve saber a razão pela qual estou aqui, creio que deixei cá algo que é meu. - comuniquei-lhe indiretamente a minha vinda, porém sentia que meias palavras bastaram. Não me cheguei a aproximar dele, fitei os seus olhos e perdi-me neles por meros segundos. Aquele homem tinha um charme natural que era raro encontrar hoje em dia, é pena se camuflar naquele senhor rígido que aparenta não ter sentimentos. Porém da última vez que cá estive apercebi-me que essas suas aparências enganam.

- Ah, sim, o seu telemóvel. - suspirei e abri uma das gavetas da minha secretária. Tirei o seu telemovel e deixei-o em cima da secretária. Não ia dizer mais nada, já estava com bastante mau-humor.

A aluna até podia ser bem intencionada mas não me apanhara num dia bom. Se é que há algum dia bom, pensei. - Está tudo bem, menina James. - Uma linha fina estreitou-se nos meus lábios, o mais perto que tinha de um sorriso - Ah, também aprecia? - perguntei automaticamente, apesar de não me interessar pela resposta. 
Fiz um sinal de pouca importância com a mão. O telemóvel dela não me incomodara. - Parabéns pela sua aplicação. Desde ontem, já ganhou um número significativo de utilizadores.

Por acaso, era mesmo isso que acontecia. Sorrir era sempre um doce e credível bluff. Eu simplesmente não gostava de sorrir, as pessoas costumavam ficar deslumbradas e eu não queria isso.
Eu concordava com ela. Limitei-me a acenar - É uma verdade. Já não se faz música como antigamente - e a conversa acabava ali para mim.
Era óbvio que ela sabia. Devia sentir-se orgulhosa do seu projecto. 
- Então percebeu que eu entrei no sistema, Brianna? Pois bem, um diretor tem de fazer aquilo que tem a fazer. É uma forma de segurança.

Eu também achara que ela ia descobrir. Brianna era inteligente, acima da média como dizia o seu ficheiro. E o sistema dela estava muito bem construído. Ainda me levara algum tempo a entrar na rede.
Desta vez esbocei um sorriso sarcástico. Não o consegui conter. 
- Acredita que muitos alunos precisam de ser devidamente vigiados . Ainda se portam coma crianças - respondi num tom convicto. - Ainda estamos longe de chegar ao meu objectivo-último.Mas isso é algo que a Menina James nunca saberá.

Se a sua teoria estava errada ou não, não lhe diria. Apenas eu sabia os meus motivos.
Ela via-me da mesma maneira que algumas pessoas. Eu nunca me importara minimamente com o que pensavam de mim. Dava-me piada que ela me analisasse daquela forma. Porém a sua curiosidade era algo que eu nunca iria resolver.
- Não é por nada, menina James, mas eu tenho coisas para fazer. E essa conversa não é exactamente uma delas. 

Suspirei e coloquei as minhas mãos na cara e fechei os olhos. - Há maneiras mais bonitas de mandar embora uma rapariga. - murmurei e almejei um pouco fechando os olhos para me concentrar naquela ação outrora praticada. - Sinceramente não percebo,  como é que uma conversa como a música, algo tão relaxado, o mete tão nervoso .- virei a cara e fitei o chão. - Mas pronto, tenho sempre esperanças de encontrar uma criatura neste colégio que dê para ter uma conversa a não ser de saídas, alcool e sexo que é o esta gente mais se preocupa. - resmunguei um pouco algo, pois isto seria um pensamento meu...não uma fala.- Desculpe se toquei onde não devia, se o coloquei aborrecido não era essa a minha intenção...não era mesmo. - estava tão habituada aquela atitude, mas ao mesmo tempo ainda me tocava...

- Esta não foi uma maneira nem bonita nem feia. Foi educada, menina James.
Respondi no meu tom habitualmente desinteressado. Ela não percebia nem era suposto perceber. No meu ponto de vista, assuntos como aqueles não eram para ali chamados. Voltei a estreitar os meus lábios naquilo que seria um sorriso sarcástico - Vê como também concorda na minha visão sobre os jovens? Talvez haja excepções, mas são todos assim. E não me aborreceu de todo.

Suspirei e encolhi os ombros um pouco.- O que é mal educado para mim pode ser bem educado para ti... para si. - corrigi rapidamente ficando um pouco embaraçada com tal situação outrora ocorrida. - Digamos que é algo subjetivo. - concluí ficando calada uns segundos deixando-o falar. - Oh, mas é da idade deles...e eu não concordo, alias o que acabei de dizer foi completamente diferente do que noutro dia lhe disse. - maldita dor de costas que me fez ter que mudar de posição novamente o que me fez suspirar. -Eu não tenho muita paciência...para esse tipo de charadas emocionais, quero começar a trabalhar ou a formar-me rapidamente. - repentinamente uma ideia agradável surgiu-me rapidamente. - Não precisa de ajuda aqui? Eu posso ajudar, não tenho nada para fazer e ajudava-me imenso no currículo  - digamos que o meu currículo era a coisa mais preenchida de sempre, desde a minha média brilhante que superava quase todos até atividades extra curriculares, organizações de eventos, voluntariado...porém nunca havia trabalho e isso era algo que eu gostava imenso de fazer.
-Entrei dois anos mais cedo para a faculdade e já o posso ajudar com papelada e assim, estou habituada por causa do meu pai . - suspirei e olhei para o chão. - Para lhe dizer a verdade queria seguir medicina e embarcar para uma ONG qualquer em África e ficar por lá. - confidenciei.Aposto que fiquei com um certo brilho nos olhos mal confidenciei tal coisa, agl qye rapidamente se apagou. - Mas como já deve ser visto, e se reparou tenho a minha vida completamente desenhada por eles. - tudo na ficha da escola tinha sido feita pelo meu pai, tanto que no futuro escreveu um bom bocado, algo que só tive o proveito de saber passado um tempo.

Isso dependia da educação de cada um, claro estava. E eu recebera uma educação às direitas. - A educação não tem muito de subjetivo, especialmente quando a sua família provavelmente tem os mesmo valores que a minha - Eram ambas altamente respeitadas.
Brianna era sem dúvida uma aluna aplicada e uma rapariga com valores morais próprios. Surpreendia-me mas tê-la no meu escritório? Não me parecia. Eu já tinha uma secretária, por muito incompetente que fosse. Aceitar uma aluna para este cargo não estava de acordo com a política do colégio - Menina James, tem capacidades acima da média. Essas capacidades não são para serem aproveitadas aqui, a organizar papéis.

Eu apercebia-me do seu olhar. Estava sempre pousado em mim. Eu raramente a fitava diretamente, não era meu costume fazê-lo. A atenção das pessoas ficava presa no meu olhar e isso era um trunfo que só usava em certas ocasiões. 
De qualquer das maneiras, não queria nenhum aluno com acesso a ficheiros da administração do colégio. Não, não queria mesmo nada. Especialmente uma rapariga esperta como ela. - Isso também. Os seus pais pagam para a ter aqui e não é a trabalhar. - Observei-a discretamente quando ela finalmente deixou de me observar. 
Ah, sim, furacão Paige. Revirei os olhos - Tenho de mandar alguém vir limpar isto. - Disse e liguei para minha secretária com as instruções para a limpeza.

Acabei por sorrir um pouco enquanto fitava o chão.-Até fez uma boa escolha, sabe? - acabei por me rir um pouco soltando por uma fim uma leve e arrastada gargalhada.- Iria dar-me muito desejo tentar...o senhor sabe. - olhei para ele com um ar um pouco de gozo.- Ver as fichas e assim .- conclui brincando-o com um sorriso brincalhão,dei de ombros um pouco, claro que não o iria fazer e isso notava-se na minha atitude. Porém, eu conseguia sem ele me dar qualquer tipo de informação. Ele era esperto, perspicaz mas devo dizer que todos os sistemas escolares têm falhas de modo em que numa situação de perigo se possa contornar. ´
Enquanto ele chamava alguém para limpar o escritório fitei uma fotografia meio escondida por detrás de um objeto um pouco grande, porém a moldura fazia-se sobressair...todavia, e mesmo assim, era apenas a moldura sem qualquer tipo de retrato ali.

Esperava que o seu interesse se focasse somente nos documentos e acesso à administração que ela teria. - Pois, já percebi que se divertiria com essas coisas - Embora muitos jovens as achassem enfadonhas e aborrecidas.
Terminei a chamada. A senhora das limpezas deveria aparecer não tarda nada.
- Agora, Brianna, se me dá licença, vou ter de sair. - levantei-me.

- Certamente mais do que eu. 
Mas isso também não era difícil. Papelada e papelada e papelada conseguia ser enfadonha ao longo de algum tempo. 
Saímos do escritório e fechei a porta atrás de mim.

Afastei a sua mão da minha. Odiava que me tocassem mas as pessoas estavam sempre a fazê-lo. 
- Tenha um bom dia, menina James.
Respondi somente por educação. Depois de ela se afastar, segui até ao parque de estacionamento e sai do colégio.

encerrado.

Antes de bater à porta limpei as lágrimas e tentei controlar-me. Respirei fundo algumas vezes e depois bati à porta. Como não obtive resposta, voltei a fazê-lo, esperando mais um bocadinho. Abri um pouco a porta e vi o gabinete vazio. Suspirei e entrei, fechando a porta atrás de mim. Sentei-me numa das duas cadeiras e deixei-me ficar à espera do director. Ao menos aqui o Mikko não me procura de certeza.

Cheguei mais tarde do que o normal naquele dia. A minha secretária dissera-me que já havia uma pessoa à minha espera, uma aluna. - Desculpa a demora - disse, fitando ligeiramente a rapariga que me esperava já dentro do meu escritório. Fui-me sentar no meu cadeirão.