Sala de Jantar

- Mikko! Ai os meus ovários... - Resmunguei muito baixinho enquanto caminhávamos para a sala de jantar e assim que entrámos, sorri de forma natural. Ou pelo menos tentei. É difícil concentrar-me nesta altura. Distribuí as bebidas pela mesa e depois comecei a cortar a lasanha em porções iguais ou praticamente semelhantes. Servi primeiro o meu pai, depois a minha mãe, o meu namorado e só depois é que me servi a mim. Decidimos ficar dois de cada lado, ficando assim os meus pais num lado, e eu e o Mikko em frente a eles. Isto vai ser complicado.
Antes de me sentar e começar a comer, dei uma espreitadela no meu menino. Aconcheguei-o bem e dei-lhe um beijinho na bochecha. Voltei então para a mesa e sentei-me. Começámos todos a comer e, de certa forma, achei que devia de dizer alguma coisa.
- Então, a que se deve esta agradável surpresa? - Agradável? Eu podia estar a ter um sexo maravilhoso e selvagem com o meu namorado... FELICE!
- Queríamos ver como está o nosso netinho lindo! Assim como queríamos saber como vocês estão, se precisam de ajuda e assim... - A minha mãe respondeu de imediato, depois de engolir o que tinha comido da primeira garfada. Eu continuei a sorrir e encolhi os ombros.
- Está tudo bem mãe, está tudo impecável. Estamos bem. - Sorri docemente, mas desta vez estava a olhar para Mikko. A minha mãe falou, impedindo-me assim de ter pensamentos perversos.
- E nós também queríamos falar com vocês por causa de outra coisa... - Começou a minha mãe, e o meu pai foi abrandando até parar de comer. O que se passa?

Eu continuei a fitá-la. Felice fazia tudo impecavelmente e até parecia concentrada mas aquelas faces ruborizadas e a sua postura diziam-me que ele estava completamente num estado de "pós sexo com o Mikko" como eu lhe chamava. Ela queria mais, eu queria dar-lhe mais. Se ainda os seus pais não tivessem aparecido... Mas tinham e por isso tínhamos os dois de estar à altura. Sentia que ainda tinha de conquistar alguma aceitação por parte dos seus pais.
- Hum sim? E falar de quê? - Perguntei, algo curioso enquanto bebericava a minha bebida.
Discretamente, deslizei a minha mão pela perna de Felice por baixa da mesa.

Mordi o lábio discretamente ao sentir a mão de Mikko, mas nada disse. Ah, ele faz de propósito! Os meus ovários ainda têm um colapso qualquer!
- O nossos aniversário de casamento está a chegar, e é claro que vocês estão convidados. É de hoje a duas semanas. E queríamos perguntar-vos quando é que... - Disse o meu pai, mas parou de falar a meio. A minha mãe interveio de imediato.
- Quando é que se casam! - Afirmou ela num tom muito entusiasmado, quase histérica. Eu sabia... Ah, porra mãe! Eu arregalei os olhos e olhei Mikko.
- Ah, ahm... Nós não... Ahm... - Balbuciei, sem conseguir dizer grande coisa.

A noticia surpreendeu-me mas não era nada por aí além. Sabia por Felice que os seus pais gostavam de organizar festas e celebrar datas. Só não fazia ideia que nos queriam arrastar para essa história de casamento. Era algo que não queria discutir, muito menos com os meus "sogros".
- Nós não temos planos de nos casarmos - Disse muito simplesmente - Lamento, Mrs. Scorpious, mas não será para já - Tentei sorrir e prosseguir com o almoço.

Fiquei de certa forma aliviada por Mikko ter tomado conta da situação por mim. Nós preferimos estar assim, e um casamento é um passo muito... Sério. Acho que nenhum dos dois está preparado para uma coisa dessas, não tão cedo.
- Sim, exatamente, mãe. Nós agora estamos bem, muito bem até... E vocês sabem que nós não estamos a pensar casar tão cedo. Falámos sobre isso quando Milo nasceu. Cada coisa a seu tempo! - Sorri docemente e voltei a comer. Hmm, a lasanha não está má.
- Ah, pois, nós compreendemos... Só estávamos a perguntar porque, se quisessem e estivessem a pensar nisso, podíamos "juntar" tudo no mesmo dia. Sendo assim... Espero ver-vos lá, no dia do nosso aniversário! - A minha mãe está sempre tão entusiasmada com estas celebrações....
- Claro mãe, lá estaremos! - Sorri-lhe e continuámos a comer.
Os temos de conversa eram variados, e ninguém voltou a falar sobre o tema "casamento", felizmente. A meio do almoço, Milo acordou, deixando a avó ainda mais contente. Deixei-a estar um pouco com ele até que eu acabasse, mas depois tive de o amamentar. Fui para o andar de cima para estar mais à vontade. Entretanto, Mikko e os meus pais terminaram de almoçar e aproveitaram para beber um café. Quando terminei, trouxe Milo comigo e entreguei-o à minha mãe, para que ela pudesse estar mais um pouco com o neto. Retirei a louça suja da mesa, tirei os restos dos pratos e depois pus a lavar. Quando eu terminei, a minha mãe informou-me que Milo tinha adormecido outra vez. É um dorminhoco, sai ao pai! O Pai... Mikko. Cozinha, sexo, ai! Outra vez! Fiquei extremamente corada, mas consegui manter a conversa.
Meia hora depois, despedimo-nos dos meus pais. Finalmente, estamos por nossa conta outra vez! Mikko foi colocar o bebé na sua caminha enquanto eu ajeitei as coisas na sala de jantar.

Meses se passaram e Mikko e eu ainda continuávamos juntos. Porém, as coisas não estavam tão maravilhosamente bem como antes. Mikko já trabalhava no College, e ultimamente estava cada vez mais atarefado. Eu fazia sempre almoço a contar com ele, mas ele nem sempre aparecia, e por vezes nem sequer avisava. Eu fiquei em casa como combinado, a tomar conta de Milo. Este crescia cada vez mais, e para mim parecia que o via a crescer a cada dia que passava. O pequeníssimo que outrora eu tinha até medo de pegar, agora já estava a ficar um bebé matulão. Bem, não tanto não é, ele tem apenas quatro meses.
Eu andava com Milo ao colo e fazia também o almoço. Como tem acontecido nos últimos dias, andava super atarefada, fazendo sempre os pratos favoritos de Mikko, na tentativa de o agradar, de ele relaxar um pouco, de o ver sorrir mais vezes. Assim que terminei desliguei o fogão e fui mudar a fralda ao bebé, arranjando tudo depois. Assim que ouvi a chave do meu marido sorri e ajeitei o bebé nos meus braços, caminhando até ele - Boa tarde querido... Como correu a manhã? - Questionei enquanto ele ia para a sala de jantar.

A minha vida tinha continuada a dar voltas. Se antes de conhecer Felice me dissessem que eu ia estar assim, pai, quase marido e um trabalhador a sério, teria-me rido pra' caraças. Mas era a verdade. Eu tinha começado a trabalhar para o meu tio e a verdade é que gostava de receber o meu proprio dinheiro, de ser importante. Agora estava quase certo de que dali a uns anos o Monroe College seria meu... imaginem, Mikko Sullivan diretor! Mas a verdade é que tinha mergulhado no trabalho, tinha-me empenhado nisso e sentia que a minha relação com Felice estava a perder o entusiasmo. Claro, amava-a e adorava-a, mas até já nem sexo faziamos todos os dias... eu chegava muitas vezes tarde, my bad.
Naquele dia estava a cegar a casa, ligeiramente mal humorado por causa de uma reunião estúpida. Ainda ia ter de voltar para o colégio. Não estava com grande apetite apesar de cheirar bem. 
- Uhhhhh foi uma manhã complicada - Disse apenas. Tirei o meu blazer e diminuiu o nó da gravata.

Peguei no blazer dele assim que ele o retirou e coloquei-o nas costas de uma das cadeiras livres. Aproximei-me dele e sorri-lhe docemente - Olha o menino, amor... Ele está muito contente por te ver hoje - Murmurei, engolindo em seco ao ver o olhar que ele fez. Não disse nada e fiquei à espera que ele lhe acariciasse o rosto no mínimo e depois aproximei-me da mesa - Querido, eu fiz aquela lasanha que tu adoras... Já não a fazia à imenso tempo - Tentei animá-lo, começando depois a servi-lo da melhor maneira que conseguia, apenas com uma mão.

Eu passava muito pouco tempo com Milo. Ele cada vez crecia mais e eu não sabia dizer se saía a mim ou à mãe. De qualquer das maneiras era um bebé lindo, eu é que ainda não sabia lidar e ser bom pai. Mas tentei. Aproximei-me dele e peguei nele. Beijei-o na face - olá campeão - Depois voltei a deixá-lo. Tinha que almoçar rápido. - não tenho muito tempo, nem muito apetite. mete pouco.

Parei o que estava a fazer e olhei para ela, incrédula com o que ele tinha dito. Respirei fundo e depois acabei por suspirar, colocando então um bocado de lasanha mais pequeno do que era costume. Tirei um pedaço para mim também e depois sentei-me ao seu lado com o bebé ainda ao colo - Espero que esteja ao teu agrado... Bom apetite, amor.

- Bom apetite - disse automaticamente, sem fazer muito caso. Comi rápido e o meu pedaço de lasanha acabou num instante. Estava boa, mas eu mal tivera tempo para saborear - Continua boa, a lasanha - Comentei. Levantei-me para ir tirar um café.

- Obrigada... - Apenas disse, vendo-o ir para a cozinha - Eu posso ir fazer-te o café se quiseres! - Disse alto para que ele me ouvisse, levantando-me para ir atrás dele, mas parei quando o vi a voltar - Oh amor... Mal paras em casa, ultimamente tens andado sempre a correr de um lado para o outro, sempre stressado... - Comentei - Mal ligas ao menino... - Sussurrei.

- Já estou a tratar disso, não é preciso - Respondi-lhe da cozinha.  Voltei já com a chávena na mão. Ouvi as suas palavras por alto - Tu sabes que eu tenho muito trabalho. e quero algum dia ser dono do colégio, tenho de fazer isto...  - Ela sabia. - Ele ainda é novo, não entende. O que eu estou a fazer é para o bem dele e do futuro dele.

- Tu não tens muito trabalho, tu tens trabalho em demasia Mikko. Tu sais cada vez mais cedo e voltas cada vez mais tarde, já para não falar das vezes que vens almoçar a correr ou não vens de todo. Ele é pequeno mas continua a ser teu filho, continua a precisar da tua atenção e do teu carinho - Falei muito a sério.

Eu não podia ter esta conversa com ela agora. - Eu faço o que tenho a fazer para sustentar esta familia! - Disse, talvez um pouco mais alto do que o pretendido. - Tenho tempo para recuperar o tempo perdido. Ele está contigo, está feliz e eu não tenho jeito .

- A sério que me estás a mandar isso à cara, Mikko?! Eu disse-te que iria trabalhar também para ajudar e tu é que não quiseste, insististe sempre que eu ficasse em casa com o Milo! E agora mandas-me isto à cara como se a culpa fosse minha, é? - Perguntei logo de seguida, incrédula - Nunca ouviste dizer que um sorriso nem sempre significa que a pessoa está contente? Eu também não tinha jeito nenhum para ser mãe e tive de ir aprendendo sozinha. Eu acho que tu devias de pensar nisso que acabaste de dizer, Mikko - Disse, bem séria.

- Não estou a dizer que a culpa é tua, caraças! Eu safo-me bem a sustentar a nossa familia, anda vos falta pois não? Mas tenho de trabalhar horas e o que eu não preciso mesmo é de chegar a casa e ainda te ouvir reclamar disso! - Não estava com paciencia para aquilo - E o quê? queres que eu repare se sorris porque estás triste? Se não estás contente não sorrias. - Fiquei stressado que até acabei por entornar o café na minha camisa - Merda!

Eu ainda tentei conter as minhas lágrimas, mas Milo ficou assustado com o tom que o pai usou e começou a chorar - Eu tenho andado todos estes dias a andar de um lado para o outro que nem escrava a fazer de tudo para te agradar, para te ajudar a andares menos stressado, a tentar animar-te, e tudo o que eu recebo ultimamente são coisas destas. - Respondi fundo e contive as lágrimas - Eu vou buscar-te uma camisa - Apenas disse e saí dali, indo buscar uma camisa branca, lavadíssima e passadíssima. Voltei pouco depois e dei-lha - Aí tens.

- Mas Felice, eu não te pedi para fazeres nada disso. Não precisas de te estares sempre a esforçar para me agradares - Respondi de seguida ao que ela dissera. Os meus nervos estavam em alta. Tirei a minha camisa e peguei na que ela trouxera e  troquei-a rapidamente - Eu tenho de me ir embora.

- Ah, peço imensa desculpa. Vou deixar de o fazer então, mas depois não te venhas queixar - Afirmei, já stressada como tudo. Respirei fundo e coloquei o menino no carro quando já estava mais calmo.
- Pois, eu já sei. Vai lá então, Mikko - Disse, virando-lhe aa costas para aconchegar melhor o menino no carro - Boa sorte e, se tiveres tempo livre para um café, aconselho-te a pensar.

Apenas revirei os olhos. Ela que virasse as culpas para cima de mim, eu não queria saber. Saí para a rua onde tinha deixado ficar o carro. Voltara a usar o Ferrari que ela me der ao invés do nosso carro familiar - Eh, eu penso - respondi irónicamente.

- Isso, goza Mikko, goza! - Disse ao ouvi-lo por ter a janela aberta, lançando-lhe um olhar furioso. Resmunguei comigo mesma e atirei qualquer coisa ao chão, o que voltou a assustar Milo. Arrependida, respirei fundo na tentativa de o acalmar e fui pegá-lo de novo. Aconcheguei-o nos meus braços e fui à janela - Não esperes que eu vá dormir contigo hoje. Aliás, provavelmente nem eu nem o nosso filho iremos dormir aqui. Se bem que nada disso te importa, não é? - Fiz um sorriso cínico e depois fechei a janela e tapei-a com os cortinados antes que ele pudesse protestar. Voltei a colocar o bebé no seu carrinho quando estava mais calmo, fazendo depois as minhas coisas. Quando tudo estava arrumado, saí de casa com Milo. Passei pela casa de Grace, a mãe de Mikko, para falar com ela, e depois fui a uma das consultas do nosso bebé. Depois disso, não voltei a casa, pois tinha pedido a Grace para passar lá a noite. Não estava com disposição para aturar as barbaridades que Mikko diz, e precisava de alguém que me ouvisse e me ajudasse.

Encerrado.